Mariana Abrantes de Sousa e Helder Oliveira, Conselho Consultivo, ETV 28-Maio-2014
Rescaldo da eleições para o Parlamento Europeu:
Em Portugal, "ganhou" a abstenção de 66%, o voto de protesto "a partir do sofá", mais 7% de votos brancos e nulos. Noutros países, juntam eleições regionais e locais para poupar dinheiro e para mobilizar mais eleitores. Adicionalmente, o voto no partido em Portugal deixa os eleitores sem saber quem, efectivamente, vai ser o seu representante.
Querer governar, neste momento, é um acto de coragem, pois a saída da crise vai passar por um carreiro muito estreito, cheio de pedras e de silvas.
A polarização politica na Europa era expectável, espelhando a gravosa divergência económica, entre países membros e dentro dos próprios países. Compreende-se que na Alemanha tenha ganho a coligação do governo, pois com diz o ditado, "em equipa que ganha não se mexe".
Qualquer esvaziamento da importância dos órgãos europeus, como o Parlamento, a Comissão, o BCE, onde os países pequenos e fracos ainda têm alguma representação, poderá vir a ser prejudicial para Portugal. Talvez o "diálogo" em torno da eleição do novo presidente da Comissão Europeia permita aos líderes ouvir algumas "verdades", e ponderar o risco de desagregação da União, que mesmo sendo "imperfeita" é muito valorizada pela maioria dos europeus.
Rescaldo do Forum do BCE em Sintra
O orador mais interessante em Sintra terá sido, certamente, o economista prémio Nobel Paul Krugman, com a sua analise da União económica europeia como uma união imperfeita, e o seu diagnóstico da crise centrado na balança de pagamentos intra-Eurozone. No que respeita o nexo de causalidade, ele aponta claramente para a entrada descontrolada de capitais, (hot money) como estando na origem de défices de comércio externo insustentáveis. Quando o tsumani de fundos se esvai, com um "sudden stop", fica o dilema dos países devedores manietados (shackled), isto é sem os tradicionais mecanismos de ajustamento. Como os países deficitários da Eurozone não conseguem alterar os preços relativos através de uma desvalorização, há duas soluções alternativas: ou os países fortes entram em expansão com alguma inflação, ou os países fracos reforçam a austeridade até à deflação, e à redução de preços.
Krugman recomenda explicitamente uma modesta inflação, até 4%, para evitar uma estagnação prolongada, à japonesa, considerando que a deflação agrava cada vez mais o sofrimento e a carga real da dívida dos países sobre endividados.
Segundo Krugman, os líderes europeus estão num estado de negação (in denial), no que respeita às consequências do risco de deflação na Europa. Esta negação da realidade foi evidente nas afirmações de outros oradores que ainda não viram vestígios de deflação, talvez porque só conhecem Frankfurt, Paris, ou o belo resort de Sintra, e não Alcântara ou Chelas. Com reduções de 10-20-30% de preços diversos, desde os salários, às rendas e até ao cafezinho, só não vê a deflação em Portugal quem não quer.
A possibilidade apontada por Mario Draghi do BCE vir a apoiar o financiamento às PMEs, sabe a pouco. Daghi promete continuar como o "bombeiro-de-serviço", que ganhou a confiança dos mercados com as suas iniciativas, mesmo enfrentando a oposição de outras autoridades europeias. De um lado, isso dá algum conforto, mas também indica que é preciso chegarmos a arder para que alguém tome as medidas necessárias. Falta saber porque é que a banca europeia não está a fazer a devida intermediação da poupança para o investimento produtivo. Afinal o BEI tem as Global Loans dirigidas às PMEs desde sempre. Mas, em Portugal continua a ser mais fácil financiar importações, do que o investimento ou as exportações.
E continuamos a ter provas de falhas de regulação e de supervisão bancária, o que é visto por alguns analistas como uma das causas da crise. O Bundesbank permitiu alavancagem bancária elevadíssima. E em Portugal, continuam a descobrir-se problemas de crédito mal parado. De facto, tem havido relativamente pouca renovação nas autoridades monetárias implicadas.
Esperemos que este forum de reflexão das autoridades monetárias europeias em Sintra, tenha permitido a necessária auto-critica, passando a trabalhar mais na prevenção do que na resolução de crises financeiras, que acarretam elevados custos sociais e riscos políticos.
Paul Krugman fez um bom serviço a Mario Draghi ao colocar o tema de expansão económica sobre a mesa, abrindo a discussão para além da ortodoxia dominante que está desajustada nova realidade económica da tal "união imperfeita".
Mariana ABRANTES de Sousa
PPP Lusofonia
Os portugueses, com os nossos brandos costumes, somos "couch protesters".
ResponderEliminarComo no Egipto http://www.egyptindependent.com/news/egypt-s-couch-party-takes-streets
Quais são os graus de liberdade na escolha de medidas para sair da crise?
ResponderEliminarHá poucas opções para politicas acertadas, mas há muitas opções de políticas erradas e custosas.
The possibility that the ECB will undertake a long-term funding programme, targeting lending to SMEs, is likely to impress less than earlier daring ECB initiatives. After all, the EIB has had Global Loans for SMEs for years.
ResponderEliminarIt also calls into question why the European financial system is not doing proper intermediation of savings into productive investment. In Portugal, it continues to be easier to finance imports than exports or investment.
Considering the high social costs and political risks which financial crisis entail, we hope that the reflection at the Sintra retreat will prompt European and national authorities to improve regulation and supervision, focusing more on prevention than on ex-post crisis management.
Krugman é provocante ao dizer que os países superavitários da Eurozone devem ter uma politica económica expansionista e tolerar alguma inflação para ajustar os preços relativos com os países deficitários.
ResponderEliminarHá quem tenha medo deste "erro de Krugman" e de sequer de pedir alívio da austeridade.
Krugman certeiro serve de carteiro para levar a carta a Berlin.
ResponderEliminarPara Draghi, é bom que alguém de fora venha dizer a Merkel o que tem que ser dito, que com deflação a divida dos países deficitários é unsustentável.
Dada a heterogeneidade da União Europeia, BCE tem que ter encontrar novos instrumentos que se adapte às necessidades diferentes.
ResponderEliminar