O orçamento do SNS foi cortado de um pico de €8.698 milhões (5% do PIB) em 2010 para €7.525 milhões (4,5% do PIB) previstos em 2012, mas ainda pesa demasiado no orçamento do Estado e dos portugueses. Este corte nas despesas públicas em saúde foi grande, mas representa menos de uma décima parte da redução prevista de um défice de 9,8% do PIB em 2010 para 4,5% previstos em 2012. Entretanto, no final de 2011, o SNS tinha acumulado uma dívida recorde de €3.000 milhões.
Como consequência, o SNS - Serviço Nacional de Saúde, que é considerado uma das grandes aquisições do 25 de
Abril, e que nos tem garantido bons níveis de acesso e de qualidade nos cuidados de
saúde, mas está agora sob forte ameaça
devido à falta de sustentabilidade financeira.
Este problema de insustentabilidade financeira do SNS e das
despesas em saúde tem causas diversas, mas passa sobretudo pela falta de disciplina
financeira em boa parte do sector. Portugal gasta mais em saúde até do que aGrécia, apesar de ter uma população igualmente envelhecida (17,9% da população
tem 65+ anos). E ainda mal começou a dar a volta. Um estudo universitário concluiu que a despesa aumentou mais nos novos hospitais EPE depois da suposta
“empresarialização” do que nos tradicionais hospitais SPA.
Já que o sector da saúde é tão importante em Portugal,
representando mais do que 10,2% do PIB, será que a internacionalização poderá vir
a fazer parte da solução neste sector tradicionalmente não-transaccionável?
Quem viriam a ser os clientes “externos” do sector da saúde?
1. Emigrantes portugueses em férias ou reformados e retornados de vez. Geralmente usufruem dos mesmos direitos, em
termos de acesso e de pagamento, que os portugueses residentes, apesar de não
estarem a pagar impostos em Portugal. No
futuro, será importante assegurar que trazem não só as suas pensões mas também
os respectivos seguros de saúde que ganharam durante a vida activa nos países
de acolhimento.
2. Doentes evacuados dos PALOPs com visto para tratamento
médico, sujeitos a quotas e referidos por juntas médicas, transferidos ao
abrigo de Acordos de Cooperação de saúde entre Portugal e os PALOPs. Portugal oferece os tratamentos médicos
(cerca de €3,5 milhões/ano), e os países de
origem são responsáveis pelas deslocações e estadias, o que falha muito. O número de doentes evacuados duplicou nos
últimos cinco anos, o que demonstra que há procura, mas falta melhor coordenação da oferta e fontes de
financiamento sustentável.
3.Imigrantes (incluindo indocumentados) em Portugal. Na lei portuguesa, o direito à saúde constitui um direito
humano fundamental, todos têm de ser servidos pelo SNS. Se forem residentes,
trabalhando e pagando impostos em Portugal, isto já não é exportação. O ACIDI
tem um serviço de encaminhamento desde 2003 para garantir o acesso dos
imigrantes aos cuidados de saúde.
4. Residentes da EU- União Europeia, que podem necessitar de
cuidados não-planeados (em viagem) ou planeados (turismo de saúde ou oriundos de
redes europeias de referência). A nova Directiva
2011/24/UE sobre os direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde
transfronteiriços foi publicada em Abril 2011, e tem que ser transposta até
Outubro 2013.
Esta nova Directiva clarifica as regras de acesso aos
cuidados de saúde noutro país da UE, incluindo o reembolso através da EHIC- Cartão Europeu de Seguro de Saúde. Os
doentes podem receber cuidados noutros
países que não o da sua residência, e o prestador de serviços pode requerer o
reembolso ao SNS ou ao seguro de saúde do país de origem (reembolso E111)
Sabe-se que há cada vez mais pacientes a procurar
tratamentos noutros países europeus e não só, mas os números disponíveis são
pouco precisos. Com toda a informação na Internet e com viagens cada vez mais
fáceis e acessíveis, a portabilidade de seguros de saúde também facilita o
recurso a tratamentos no estrangeiro. Portugal tem boas condições para atrair
este tipo de doente, o importante é garantir a recuperação integral dos custos.
Algumas das especialidades em que há mais pacientes a viajar são a medicina
dentária, cirurgia plástica e o bem-estar, incluindo o termalismo. O mercado
está a crescer, mas já há muitos países a tirarem proveito do turismo da saúde,
como a Espanha, a Africa do Sul, a Tailândia, etc.
5. Residentes estrangeiros em Portugal com ou sem seguro de
saúde, incluindo especialmente pensionistas reformados. Segundo as novas regras
da União Europeia, o país que paga a pensão é o país que deve também suportar
os cuidados de saúde do pensionista. Na
Europa há pensionistas que trabalharam em 3-4 países diferentes, por isso esta
regra não é simples de aplicar. Isto é muito importante para os países do “Club
Med” que atraem pensionistas com mais de 65 anos, que têm duas ou três vezes mais despesas com
saúde do que pessoas 15 ou 20 anos mais jovens.
Mais uma vez, para vir a ser a “Florida da Europa”, Portugal terá que
ter acesso a fontes externas de reembolso das despesas de saúde dos idosos
expatriados, como o Medicare americano que é um programa federal.
6. A (re)exportação de medicamentos homologados pelo
INFARMED e com bula em português, para os PALOPs faz todo o sentido pelas
economias de escala. O que não é
aceitável é que seja o contribuinte português a suportar os custos, havendo
quem queira ganhar bastante mais do que o normal. Na mega-fraude detectada recentemente, médicos
passavam receitas de medicamentos comparticipados em nome de doentes fictícios,
que eram aviadas por terceiros que depois revendiam os medicamentos no
exterior. Estima-se que a fraude tenha custado cerca de 50 milhões de euros ao
SNS.
Portugal também reduziu as margens de lucro para grossistas
e farmácias, de maneira que alguns medicamentos são bastante mais baratos em
Portugal do que noutros países europeus.
As exportações “paralelas” tiram proveito desta diferenciação de preços,
sem grande benefício para Portugal, a menos que sejam produzidos em Portugal
sob patentes portuguesas.
7. Prestação de serviços de saúde transfronteiras, como a telemedicina
está cada vez mais facilitada com os novos meios de comunicação.
8. Formação de profissionais da saúde é outra actividade com
grandes economias de escala em que Portugal e os PALOPs teriam vantagem em
agregar e coordenar esforços.
Para internacionalizar o sector de saúde português, é
necessário sobretudo ganhar massa critica, com iniciativas conjuntas como o
Health Cluster Portugal, conhecer os
potenciais clientes e concorrentes e investir de um forma orientada, coordenada
e sustentada, com uma oferta bem dirigida, bem estruturada e bem remunerada. O
Estado pode participar neste processo, racionalizando o próprio SNS e abrindo
portas às exportações com contactos oficiais de alto nível, mas trata-se
sobretudo de uma iniciativa do sector privado.
E as importações de saúde, isto é os pacientes portugueses
que procuram tratamento no estrangeiro?
Quanto menos melhor, o ideal seria satisfazer as nossas
necessidades de saúde “cá dentro”. Tal como antigamente, cortar nas importações
é poupar “divisas”, e no poupar é que está o ganho.
Mariana Abrantes de Sousa
PPP Lusofonia, Julho 2012
Despesas em saúde acima da média http://ppplusofonia.blogspot.pt/2010/01/despesas-totais-em-saude-acima-da-media.html
Paying for pensioner health care, your budget or mine? 1, 2
Doentes evacuados dos PALOP
Paying for pensioner health care, your budget or mine? 1, 2
Doentes evacuados dos PALOP
/ Health Cluster Portugal http://healthportugal.comhttp://healthportugal.com/Quem%20somos/documentos/pr-estudo-hcp.pdf
Fundação Champalimaud http://healthportugal.com/noticias/portugal-on-the-medical-map/?searchterm=10
Fundação Champalimaud http://healthportugal.com/noticias/portugal-on-the-medical-map/?searchterm=10
O SNS deveria ter alguns tipos de contratos mais flexiveis, talvez uma bolsa de profissionais itinereantes, que lhe permitisse contratar directamente médicos, enfermeiros e outros profissionais para fazer face às suas necessidades pontuais e variáveis, sem ter que o fazer através das empresas de trabalho temporário e agências de outsourcing.
ResponderEliminarCom a contratação directa, sem a margem de lucro das agências, os profissionais podiam ganhar mais, e o contribuinte pagar menos.
Em 2011, o SNS enviou 60 doentes oncológicos para o estrangeiro por inexistência de recursos técnicos e tecnológicos em Portugal, segundo o Programa Nacional para as Doenças Oncológicas, que está em consulta pública.
ResponderEliminarEm 2010 foram enviados para o estrangeiro 53 doentes, o que representou para o SNS um custo estimado em cerca de 1,2 milhões de euros, refere o programa da Direção-Geral da Saúde, que conta com o apoio financeiro correspondente a 0,8 por cento dos resultados líquidos dos jogos sociais...
Fonte: http://www.ionline.pt/portugal/cancro-sns-enviou-60-doentes-estrangeiro-2011-falta-recursos-tecnicos
Entrevista de José Manuel Silva, Bastonário da Ordem dos Médicos à revista FrontLine, Março 2012, pg 15
ResponderEliminar"...começa a haer um excesso de médicos;... havia teoricamente falta de médicos, mas essencialmente por problemas de organização, porque a média de médicos em Portugal sempre esteve na média ou acima da média dos países da OCDE...mas havia graves problemas de organização e produtividade do SNS, que também não eram da responsabilidade dos médicos (?)...Médicos a mais são prejudiciais para o doente, porque não só aumentam os custos em saúde, com e mercantilizam a saúde e os doentes.
Estamos acima da média de médicos da OCDE, e com a concentração do SNS a que estamos a assistir , o número de vagas em saúde está a diminuir e o mercado privado está, no essencial, saturado. Um dos sinais que permite objectivar isso de forma muito económica é o facto de as seguradoras (privadas) imporem reduções no preço de pagamento aos especialistas no sector privado de forma unilateral...