Debt workout 101 -
A renegociação que faltava
O recente “Manifesto dos 70” serve para colocar o tema da insustentabilidade da dívida em discussão, em vez de obedecer aos tabus impostos pelos credores. A Irlanda já renegociou, bem, parte da sua divida externa. A Grécia nem sequer negociou, acabou por receber um “haircut” imposto pelos credores oficiais sobre os credores privados. Uma renegociação mal feita, um exemplo do que pode acontecer a um país que perde o controlo de suas finanças.
A renegociação que faltava
O recente “Manifesto dos 70” serve para colocar o tema da insustentabilidade da dívida em discussão, em vez de obedecer aos tabus impostos pelos credores. A Irlanda já renegociou, bem, parte da sua divida externa. A Grécia nem sequer negociou, acabou por receber um “haircut” imposto pelos credores oficiais sobre os credores privados. Uma renegociação mal feita, um exemplo do que pode acontecer a um país que perde o controlo de suas finanças.
Renegociar as condições de pagamento com os credores é absolutamente
normal na banca, e há princípios de “credit workout” bem estabelecidos. Um desses princípios é a partilha de sacrifícios.
Afinal de contas, os credores são co-responsáveis pelo nosso excessivo
endividamento, pois ninguém os obrigou a emprestar.
Sustentável mas pouco
A troika e a imprensa financeira concentram todas as
atenções na divida pública directa, em
vez de focar a divida pública alargada, incluindo PPPs e empresas
públicas. Mas o verdadeiro problema é a elevada
divida externa bruta, incluindo a pública e a privada.
O FMI coloca a divida publica portuguesa em 129% do PIB, mais do dobro do limite de 60% definido para a
Eurozone, e ainda muito acima do nível 90% do PIB onde começa a penalizar o crescimento, de acordo com o trabalho importante de Reinhart and Rogoff.
Mas a dívida privada de 255%
do PIB é ainda mais preocupante,
mas não se ouve falar disso na imprensa
portuguesa. Enquanto o FMI fala em desalavancagem
das empresas e famílias portuguesas, os jornais ocupam-se com novas
campanhas de crédito ao consumo.
E isto sem quantificar os encargos líquidos com pensões.
E isto sem quantificar os encargos líquidos com pensões.
Aparentemente, a negação e falta de realismo dos pensionistas e
do Tribunal Constitucional contagiou as administrações dos bancos e das
autoridades monetárias.
Credores externos fogem à co-responsabilidade
Ao evitar entrar em default, Portugal foi reembolsando a
dívida vincenda e de curto prazo, privilegiando os credores externos. Para isto, os bancos portugueses recorreram a
funding o ECB para se poderem substituir aos credores em fuga. Se tivesse havido algum incumprimento ou suspensão de
pagamentos, os reembolso teriam sido congelados e a renegociação tornar-se-ia
obrigatória.
Sendo os credores externos a mandar e a ditar os tabus,
os sacrifícios continuarão totalmente do
lado dos devedores locais.
Em qualquer caso, é natural que haja conflito de interesses entre os pensionistas e os investidores obrigacionistas, pois ambos dependem da capacidade de pagamento do Estado e ambos querem ser privilegiados na distribuição da escassa receita fiscal.
Em qualquer caso, é natural que haja conflito de interesses entre os pensionistas e os investidores obrigacionistas, pois ambos dependem da capacidade de pagamento do Estado e ambos querem ser privilegiados na distribuição da escassa receita fiscal.
Recomendações
inconsistentes
No seu relatório, o FMI continua a insistir em mais cortes
salariais, uma “solução” que vai mais uma vez provar ser equivocada. Primeiro, porque o corte no rendimento disponível das famílias
vai provocar ainda mais crédito mal parado na banca; e mais desespero de quem
está em risco de perder o carro e a casa como ouvimos os policias dizer esta
semana na escadaria de S. Bento. O FMI
recorda que ainda restam €4,9 biliões dos fundos para recapitalizar a banca. Entretanto
há crescimento do emprego nos “agentes de execução”.
E já lá vai o tempo em que os baixos salários atrai investimento
directo estrangeiro virado para a exportação.
O sucesso do sector externo vai
depender da capacidade da empresas nacionais venderem no estrangeiro, não dos estrangeiros
virem cá comprar. A redução dos salários
pode reduzir importações, a forma mais dolorosa de o fazer, no país do consumismo e das bimby.
Se não conseguirmos renegociar
os prazos e taxas, vamos falhar nos montantes
Em vez de assistir à dança de credores, devíamos chamá-los
à colação para conseguirmos melhores condições em termos de prazo e de taxa. Pagar a dívida existente a 20 ou mais anos e
reduzir taxas para 2% é essencial, mas
nem isso é suficiente.
O que faz falta é a negociação de novos financiamentos aos
sectores produtivos e de cobertura e redução dos prémios de risco-país para que
um projecto português consiga ser financiado nos mesmos termos que projectos semelhantes
no resto da Eurozone. Mas o FMI não tem receita para melhorar o
financiamento do sector exportador e às SMEs.
O próprio BEI preocupou-se mais em
conseguir a substituição de garantias bancárias por garantias do Estado do que
em financiar as exportações portuguesas.
As avaliações da nossa capacidade de reembolso divergem, mas
a experiencia indica que um devedor em crise que não consegue facilidades de
pagamento acaba por falhar nos reembolsos.
Gestão financeira portuguesa tem que dar provas
A má gestão financeira que nos trouxe a esta crise continua
com um misto de impunidade e ingenuidade.
Os processos prescrevem em tribunal.
Quem levanta questões inconvenientes é acusado de irresponsável e é exonerado
das suas funções. Anunciam-se
investimentos em infra-estruturas sem qualquer referencia a estudos de tráfego.
A desorçamentação de PPPs e das empresas
publicas ainda não cumpre a lei. A desastrosa afectação de recursos em em projectos improdutivos ameaça continuar.
E, não bastando ignorar as mensagens de alerta, dá-se cabo dos mensageiros.
E, não bastando ignorar as mensagens de alerta, dá-se cabo dos mensageiros.
Tem mais impacto negativo na balança de pagamento, e
portanto no rating da República Portuguesa, a opção facultativa de aumentar o
crédito ao consumo do que a imperiosa necessidade de alargar os prazos
de reembolso de dívida externa.
E o consenso alargado vai ter que esperar, quando os devedores se deixam capturar por uns e outros credores.
Mariana Abrantes de Sousa
PPP Lusofonia
Alertas circa 2006 - http://ppplusofonia.blogspot.pt/2006/07/delivering-ppp-promise.html
Debt Workout 101 http://ppplusofonia.blogspot.pt/p/crise-da-eurozone.html
Reis, 2013 The Portuguese Slump and Crash and the Euro Crisis http://www.nber.org/papers/w19288
Reinhart and Rogoff, Causalidade entre dívida e estagnação http://ppplusofonia.blogspot.pt/2013/04/on-reinhart-and-rogoff-debt-and-growth.html
Reis, 2013 The Portuguese Slump and Crash and the Euro Crisis http://www.nber.org/papers/w19288
Reinhart and Rogoff, Causalidade entre dívida e estagnação http://ppplusofonia.blogspot.pt/2013/04/on-reinhart-and-rogoff-debt-and-growth.html
Sem inflação não se consegue reduzir a carga real da dívida, e sem financiamento à exportação não se consegue aumentar a capacidade de reembolso.
ResponderEliminarGostei de ler a sua opinião, já agora, solicito-lhe um empréstimo de 50 000€.
ResponderEliminar1. Qual é a finalidade do empréstimo?
ResponderEliminar2. Qual será a fonte de reembolso?