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quarta-feira, fevereiro 05, 2014

O crescimento económico, gota a gota




Fala-se de crescimento económico quando há crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) entre dois períodos de tempo, em regra, um ano.

O PIB de um país é a soma dos valores das seguintes parcelas: Consumo das famílias, Investimento privado (empresas e famílias), Despesas correntes ou de capital do Estado (todo o sector público)  e ainda Exportações líquidas (exportações menos importações).

Uma das teorias defendidas pelos economistas liberais é ilustrada pela “Curva de Laffer”. Esta teoria diz que, a partir de um certo limite, mesmo que o Estado pretenda cobrar mais impostos o resultado pode ser o inverso porque as pessoas deixam de trabalhar ou de investir quando sentem que uma parcela demasiado elevada do que ganham vai para impostos.

Ou seja, o Estado quer cobrar mais impostos mas pode acabar por receber menos.

Concluem então esses economistas liberais que, para promover o crescimento, é importante reduzir os impostos das grandes e médias empresas ou das pessoas de rendimentos mais elevados para que se sintam motivados a fazer mais investimentos e aumentar os seus ganhos depois de tributados.

Acreditam que a poupança dos mais ricos, vai traduzir-se (infalivelmente) em investimentos privados indo algum rendimento, tipo gota a gota, parar às mãos dos trabalhadores.

Estas políticas de promoção do crescimento, através da redução fiscal sobre os mais ricos, como foram  executadas por Reagan, na América nos anos 80, ficaram conhecidas por “crescimento económico gota a gota” (Stiglitz, J. “Os Loucos anos 90”, P. 351, Terramar). O resultado, como era de prever, foi tornar os ricos mais ricos e os pobres mais pobres e com menos benefícios sociais e serviços públicos por aperto orçamental, enquanto o défice das contas públicas disparava. 

A mesma lógica levou à diminuição recente (dezembro 2013) dos impostos sobre os lucros (IRC) em Portugal, em particular a pagar pelas grandes e médias empresas.

E era essa, também,  a lógica do aumento da TSU (setembro de 2012) sobre os trabalhadores e redução da TSU a pagar pelas empresas que o atual governo queria aplicar (recuou, teve medo...) seguindo essas “ideias geniais”que supunham que as empresas, recebendo essas “benesses” iriam logo transformar em investimentos, independentemente das expectativas das suas vendas que andavam (e continuam) pelas ruas da amargura por falta de “pilim” nas mãos dos potenciais clientes.

O que eles pretendem, os economistas e políticos liberais conservadores, é um “crescimento  económico gota a gota”, ou seja  “ vamos dar aos ricos que estes, depois, vão fazer chegar umas gotas ou migalhas aos pobres” .

Na realidade, até pode acontecer que o PIB cresça umas décimas percentuais para gáudio e “descoberta de milagres” por esses economistas e políticos bem instalados.

Mas o que é garantido sim, é o aumento da pobreza de faixas cada vez maiores da população portuguesa, o aumento do recurso á caridade para sobreviver e o cavar mais fundo do fosso, escandaloso desde há muito, entre ricos e pobres em Portugal.

Para esses “experts” tudo isso é normal. É uma consequência do funcionamento dos mercados “livres, eficientes, com um mínimo de regulamentação e de intervenção estatal” apenas guiados pela famosa “mão invisível” de Adam Smith.

António C. Abrantes
 Economista, Professor aposentado do IPV.


1 comentário:

  1. Senhor Professor António C. Abrantes,
    Teria sido interessante que o seu artigo completasse a análise à teoria económica liberal com mais três aspetos.
    O primeiro aspeto é ideologia.
    Liberalismo defende a propriedade privada dos meios de produção. Toda a programática do liberalismo decorre desta defesa da propriedade privada dos meios de produção. E as duas principais e imediatas decorrências são: liberdade e paz.
    O segundo aspeto é a proteção dos mais fracos para que não haja poderes de mercado desequilibrados.
    Desde a Revolução Francesa, várias correntes de pensamento Liberal (Thomas Paine) e Neo-Liberais ( Friedrich Hayek e Milton Friedman) mais que um salário mínimo defendem uma renda mínima como sendo o instrumento mais eficiente no combate à pobreza e na defesa de salários dignos.
    O direito natural à propriedade de todo e qualquer cidadão justifica que todo proprietário é devedor à comunidade de um “aluguer natural” que deverá pagar ao Estado e que deve ser redistribuído sob a forma de renda anual para todos.
    O terceiro aspeto é o direito sucessório.
    A desigualdade na riqueza e no rendimento é a maior crítica a que está sujeito o liberalismo. Diz-se que a teoria económica Liberal está focada no crescimento e desenvolvimento desprezando a função redistributiva do Estado.
    Na perspetiva dos liberais os mecanismos de redistribuição da riqueza devem operar-se ao nível dos impostos sucessórios e mesmo dos direitos sucessórios.
    A igualdade é o tema de fratura entre liberais e neoliberais. No iluminismo os homens eram entendidos como iguais nos direitos civis e políticos. Deus criou os homens iguais e as distinções entre os homens é artificial, é um produto da sociedade e por esse facto algo transitório que um dia será ultrapassado. Pelo contrário para os neoliberais a verdade material é que não há dois homens iguais e que os homens nunca conseguiram transformar um branco num preto e vice-versa. Contudo os neoliberais defendem a igualdade de direitos civis como melhor forma de manter a paz social, a cooperação social e portanto como sendo a melhor forma de organização social. Os neoliberais não defendem mais que isto, não defendem mais igualdade que a dos direitos civis. Só os liberais defendem o caminho para a total igualdade entre os homens. Os neoliberais preocupam-se em preservar a propriedade privada pelo seu papel na geração de riqueza, paz e liberdade. Aos neoliberais não importa saber se essa propriedade é distribuída de forma equitativa ou não.
    Importa distinguir Liberais de neoliberais. Com magnitudes diferentes, ambos têm preocupações com o papel que o Estado deve ter ao nível da redistribuição do rendimento.

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