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domingo, março 01, 2020

Portagens para que quero, em estradas SEM utilizadores, SEM receita

O Governo acaba de anunciar a redução de portagens em sete autoestradas (ex-SCUT) e já há contestação da parte dos residentes do Interior que reclamam a eliminação definitiva.  
VER https://www.reconquista.pt/articles/portagens-plataforma-chumba-proposta-para-reducao-de-precos
Quem tem razão ?  
Ambos os lados, como sempre. 

As ex-SCUT são autoestradas sobretudo "horizontais" que ligam o litoral ao interior do país, cada vez mais despovoado. Por isso foram desenhadas Sem Cobrança ao Utilizador (SCUT), pois já se sabia que o volume de tráfego não resistiria ao preço (high price elasticity). Outra autoestrada "horizontal", a concessão Norte (que liga o litoral com o interior montanhoso de Portugal, até próximo da fronteira com Espanha, ao longo de 179Km de paisagens magníficas) foi desenhada com portagens desde o inicio e o tráfego de 2010 estava apenas a 46% do previsto no cenário base. 

Com a introdução de portagens e a recessão, tivemos o pior dos resultados nestas estradas. Pior de que uma estrada desnecessária, mesmo só uma estrada (quase) vazia, sem utilizadores, sem receita de portagens, sem receita do ISP - Imposto sobre Produtos Petrolíferos. Acaba por sobrar sempre mais fatura para os contribuintes. 

Sempre se soube que as portagens provocam DESVIO ou quebras de tráfego.  Quando o Governo decidiu introduzir portagens nas SCUT, o provável desvio de tráfego foi considerado mas menosprezado, estimado quando muito em 15%.  A realidade revelou-se muito pior. 

As portagens foram introduzidas em autoestradas SCUT em momentos diferentes em 2010 e 2011. Em contraste, a crise económica terá afetado todas as estradas em simultâneo.

Os dados parciais de tráfego de 2012 nesta imagem mostram uma quebra média de 39% nas estradas com portagens recentes, introduzidas em Dezembro 2011. A descida de tráfego nas estradas com portagens mais antigas era de apenas cerca de 7-10%Isto sugere que a introdução de portagens terá causado desvio de tráfego de cerca de 30%, com todo o risco de tráfego passado para o lado do Concedente. 

Por consequência, a receita de portagens nas ex-SCUT depois das renegociações de 2010 terá ficado muito abaixo do previsto pelo Concedente.  Como a receita de portagens iria compensar parcialmente o Concedente pelo pagamento à concessionária pela "disponibilidade da estrada",  a maior quebra de tráfego agravou o esforço financeiro liquido e o impacto orçamental.  Afinal o contribuinte paga tudo. 

Mariana Abrantes de Sousa 
Economista e Especialista PPP 
( I repeat the challenge I have often made to the students in my Nova SBE  Project Finance course since 2012 to study and publish analyses of  the price-elasticity and income elasticity of traffic volumes using Portugal as laboratory.)