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quarta-feira, fevereiro 10, 2016

Agravar o crédito ao consumo, finalmente

Reorientar a economia em três perguntas Dinheiro Vivo
O agravamento do imposto do selo sobre o crédito ao consumo era uma medida que se impunha. 
Uma das principais funções da política fiscal e orçamental é reorientar a atividade económica para responder aos grandes desafios nacionais, como o de inverter a queda da poupança, que atingiu novos mínimos insustentáveis (cerca de 5% do rendimento nacional em 2015). 
Neste contexto, o agravamento do imposto do selo sobre o crédito ao consumo era uma medida que se impunha, para colocar as famílias portuguesas no caminho da independência financeira, e que eu tenho vindo a recomendar pelo menos desde 2011. 
1. Primeiro, porque é que a tributação do crédito ao consumo é melhor do que o aumento de outros impostos? 
A subida do imposto do selo no crédito ao consumo só vai arrecadar mais 120 milhões de euros em receitas fiscais, mas é considerada uma medida estruturante porque vai desincentivar o financiamento de atividades não produtivas, deixando mais liquidez disponível para financiar empresas (crowding-in), especialmente as pequenas empresas e as exportações. Uma vez que muitos dos bens de consumo financiados são importados, o agravamento fiscal pode cortar a importação de automóveis, tablets, consolas e afins. O Mercado único e a Moeda única acabaram com a aplicação de tarifas alfandegárias e  desvalorizações cambiais, mas não com a necessidade de cortar o défice da balança comercial. A redução de algumas taxas de juro deixa algum espaço para subir estes impostos, tais como o imposto sobre produtos petrolíferos. 
2. Segundo, porque é que levou tanto tempo – cerca de oito anos de crise – para implementar esta medida, se ela é assim tão “evidente”? 
A indústria do crédito ao consumo suplantou a tradicional intermediação bancária que se dedicava a canalizar as poupanças dos particulares para os investimentos empresariais. Com a crise, e com o agravamento dos riscos e exigências das regras de Basel III, o crédito ao consumo tem sido praticamente o único a crescer. Até a Caixa Geral de Depósitos lançou uma campanha de “fracionamento de compras” na quadra festiva. Parece que os portugueses precisam mesmo é de comprar consolas de videojogos a prestações. 
Há muito tempo que era imperativo dar um sinal inequívoco da necessidade de desalavancar as famílias sobre-endividadas, com uma medida que viesse disciplinar tanto os particulares, como os bancos e as sociedades de aquisição a crédito. Estas vieram logo a terreiro contestar a iniciativa. Parece que os credores não se preocupam em fazer crédito subprime a clientes sobre-endividados desde que eventuais perdas venham a ser superadas com novas recapitalizações oriundas do contribuinte. 
3. Terceiro, o que espera os consumidores endividados no futuro? 
No fim dos anos 1980, no rescaldo de outra crise financeira, o crédito automóvel e ao consumo eram praticamente inacessíveis. Foi nesse tempo que apareceram os contratos ALD – aluguer de longa duração. Mais tarde apareceram também os financiamentos de 110% do preço da casa no crédito à habitação, para financiar a mobília, os cortinados e a festa de inauguração. Será esperar demasiado que os supervisores e reguladores detetem e atalhem estes abusos mais atempadamente desta vez? 
A política de crédito e a politica fiscal são dos poucos instrumentos de ajustamento económicos que nos restam para ajustar e reestruturar a frágil economia portuguesa. 
Toca a utilizá-los.
Mariana Abrantes de Sousa 
6-Fev-2016 
*Economista e autora do blogue PPP Lusofonia 
 Veja mais em: http://www.dinheirovivo.pt/opiniao/reorientar-a-economia-em-tres-perguntas/#sthash.cDlwk8gq.dpuf 
ASFAC contesta http://dinheirodigital.sapo.pt/news.asp?id_news=242649 

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